Inventário extrajudicial e incapacidade: O impacto da Resolução 571 na prática jurídica

Inventário extrajudicial e incapacidade: O impacto da Resolução 571 na prática jurídica

A resolução 35 do CNJ foi recentemente alterada pela resolução 571 de 26/08/2024, que trouxe várias inovações aos procedimentos extrajudiciais, uma delas é a possibilidade de realização de inventário extrajudicial com incapaz. Antes da alteração trazida pela nova resolução, as condições para realização de inventário por escritura pública, ou seja, inventário extrajudicial, eram basicamente duas, quais sejam: a inexistência de herdeiro incapaz e o consenso entre todos os herdeiros. Todavia, com o advento da nova resolução, especificamente o artigo 12-A, torna-se possível e viável, mesmo havendo herdeiros incapazes, a lavratura de escritura pública de inventário em cartório, observadas e cumpridas determinados requisitos contidos no mencionado artigo. O primeiro requisito, expresso no artigo 12-A, impõe que o pagamento do quinhão hereditário ou meação em favor do interessado incapaz ocorra em parte ideal em cada um dos bens inventariados. O segundo requisito previsto na norma exige a manifestação favorável do Ministério Público. Numa leitura rápida do dispositivo, as condições trazidas pelo artigo 12-A não oferecem aparentemente obstáculos, contudo, algumas dificuldades podem ocorrer diante de casos concretos específicos. Com relação ao requisito do pagamento obrigatório do quinhão hereditário ou meação em parte ideal e em cada um dos bens, o primeiro questionamento que surge é como se daria esse pagamento? E o que isso significa na prática e quais seriam os eventuais desdobramentos? Quinhão ideal dos bens, nada mais é do que o condomínio obrigatório a que faz jus o herdeiro/interessado incapaz em todos os bens do inventário, juntamente com os demais herdeiros. Isso significa que no inventário extrajudicial, o menor ou incapaz deterá obrigatoriamente uma parte ideal em cada um dos bens relacionados no inventário, não cabendo, nesse procedimento, a distribuição dos bens de forma individual e isolada entre os herdeiros. Isso representa na prática um verdadeiro travamento de todos os bens, visto que o incapaz teria direito a uma parcela sobre todos os bens inventariados. No que se refere à manifestação favorável do MP, como requisito a ser observado para a realização de inventário extrajudicial com incapaz, a norma silencia em que momento deverá ocorrer (antes ou depois), portanto, importa verificar o aspecto temporal dessa manifestação, sendo recomendável ao advogado submeter previamente ao MP a minuta de escritura com todas as informações e documentos, a fim de evitar o pagamento de custos e emolumentos desnecessários, caso o MP não seja favorável. Caso o Ministério Público considere injusta a divisão deverá remeter o inventário ao juiz. Da mesma forma, se o tabelião tiver dúvidas quanto à validade da escritura deverá encaminhar ao juiz competente. Ainda com relação ao condomínio obrigatório, havendo necessidade ou interesse dos herdeiros em alienar determinado bem do inventário, esta deverá contar com a autorização judicial (§1º – Art. 12-A), uma vez que é vedado ao incapaz atos disposição de direitos e bens (ex. renúncia, cessão de direitos etc.), o que, de certa forma, engessa o procedimento extrajudicial. Resta evidente o objetivo contido na norma ao prever os requisitos para a realização do inventário extrajudicial, que visam à proteção dos direitos dos incapazes, mas que, por outro lado, acabam por dificultar, por exemplo, a venda de bens. Nesse contexto, é importante considerar que, dependendo do caso concreto e dos interesses específicos das partes envolvidas, um aconselhamento jurídico prévio ao cliente se torna imprescindível. Essa orientação não apenas esclarece os aspectos legais envolvidos, mas também permite uma análise mais aprofundada das particularidades do inventário, especialmente quando há um incapaz no processo. Com essa avaliação cuidadosa, será possível determinar se a opção pelo inventário extrajudicial é realmente o melhor caminho a ser seguido, garantindo assim a proteção dos direitos de todos os envolvidos e a efetividade do processo.

Transformação digital no imobiliário: Governança de dados e o papel da privacidade nas parcerias

Transformação digital no imobiliário: Governança de dados e o papel da privacidade nas parcerias

Neste artigo, vamos falar sobre a transformação digital no imobiliário: governança de dados e o papel da privacidade nas parcerias. Leia mais abaixo!   Engana-se quem pensa que privacidade, proteção de dados pessoais e segurança da informação se restringem a ambientes tecnológicos bem estruturados. Um efetivo sistema de gestão em privacidade, proteção de dados pessoais e segurança da informação envolve muito mais do que apenas tecnologia, abrange temas como: i) conscientização do board, ii) recrutamento e seleção de pessoas que sejam capazes de compreender e internalizar em suas operações e áreas de negócio conceitos básicos de privacidade e segurança da Informação, iii) avaliação e gestão de risco de terceiros, o que pressupõe uma análise crítica daqueles que fazem parte da jornada e operação de uma empresa, iv) desenvolvimento de políticas e diretrizes que sejam capazes de alinhar a estratégia da organização às práticas de privacidade, proteção de dados pessoais e segurança, v) campanhas de conscientização e capacitação interna sobre tais diretrizes, vi) definição de planos de continuidade de negócio, em especial e com ênfase em segurança da informação, o plano de recuperação de desastres tecnológicos, vii) definição de mecanismos de monitoramento de indicadores de performance do sistema de gestão, dentre outros.   É neste cenário que surge um grande desafio para aquelas empresas que dependem de terceiros para efetivar os seus negócios. No setor de incorporação imobiliária, onde se lida com um grande volume de informações pessoais de clientes esses desafios são amplificados pela complexidade das relações comerciais envolvidas. A necessidade de adaptação às exigências legais vai além da teoria e exige a implementação de práticas eficazes de privacidade, proteção de dados pessoais e segurança da informação. Essa realidade impõe uma reflexão profunda sobre as dificuldades enfrentadas por esse setor para implementar um sistema de gestão eficaz frente aos controles de privacidade e de segurança da informação. Um dos primeiros desafios a serem superados é garantir a transparência no tratamento de dados pessoais. Para incorporadoras, é fundamental que os clientes compreendam claramente como suas informações serão coletadas, utilizadas e armazenadas. Isso é especialmente relevante no contexto de lançamentos de empreendimentos imobiliários e stands de vendas, onde os dados dos clientes são frequentemente coletados de maneira pouco clara. Tornar essas práticas mais transparentes demanda o uso de estratégias que facilitem o acesso à informação, como a disponibilização de avisos de privacidade em locais visíveis. É imprescindível, portanto, esclarecer o papel dos parceiros de negócio no processo de vendas, isto é garantir informações sobre corretores e imobiliárias, que atuam como controladores independentes de dados e detém as suas próprias responsabilidades no uso da informação pessoal do cliente, o que reforça a necessidade de uma comunicação mais eficaz.   Além da questão da transparência, outro aspecto crítico está relacionado à gestão de sistemas internos de vendas, como as plataformas de gestão de empreendimentos. Esses sistemas, essenciais para o desenvolvimento comercial do negócio, bem como acompanhamento e gestão de vendas, precisam estar em conformidade com as exigências de segurança da informação. O tratamento de dados pessoais nesses ambientes deve ser conduzido com rigor técnico, o que inclui a implementação de políticas de controle de acesso, segregação de bases de dados e registro de logs de atividades, pois, na maioria das vezes, corretores e imobiliárias detém acesso aos sistemas e aos clientes/leads que abriram oportunidades. Aqui surge um outro desafio: conscientizar corretores autônomos e imobiliárias sobre a importância de apenas utilizar dados de pessoas que efetivamente tenham demonstrado interesse em um determinado empreendimento, visando garantir que não extrapole nenhuma expectativa do titular de dados, no caso, o cliente. Pensando nisto, a capacitação dos atores envolvidos no setor imobiliário também se mostra fundamental para garantir a conformidade com a LGPD. Corretores, imobiliárias e equipes de recepção em um novo lançamento de empreendimento frequentemente lidam diretamente com informações pessoais, o que exige uma educação contínua sobre suas responsabilidades no tratamento de dados pessoais. No entanto, a falta de treinamento adequado ainda é um obstáculo significativo. Conforme já mencionado, corretores, que frequentemente trabalham para múltiplas construtoras e empreendimentos, têm o dever de atuar como controladores independentes de dados, sendo fundamental que estejam cientes de suas obrigações legais. Da mesma forma, as equipes que atuam em stands de vendas e eventos de lançamento de empreendimentos, que precisam ser orientadas sobre como manusear essas informações com segurança e sobre a importância de prestar esclarecimentos claros em caso de questionamentos relacionados à proteção de dados pessoais.   Imprescindível dizer que construtoras frequentemente dependem de fornecedores, prestadores de serviços e outros parceiros que têm acesso a dados pessoais. Nesse cenário, a realização de due diligence na contratação de fornecedores e a inclusão de cláusulas contratuais que estabeleçam responsabilidades claras quanto à segurança da informação são medidas básicas e que devem ser implementadas. Porém, o monitoramento contínuo de tais medidas é igualmente crucial. Afinal, o terceiro também faz parte da organização. E quando trazemos a questão dos terceiros, podemos falar em parcerias estratégicas, comuns no setor imobiliário, e que também apresentam desafios relacionados ao compartilhamento de dados pessoais. Parcerias com empresas de móveis planejados, por exemplo, são frequentes e agregam valor ao negócio, mas é necessário garantir que o compartilhamento de informações pessoais com essas empresas seja realizado de maneira transparente e em conformidade com a LGPD. Isso significa que os clientes devem ser informados sobre esse compartilhamento desde o início da relação e que seus direitos sejam garantidos, como o de solicitar a oposição à tal compartilhamento ou de não ser contatado, devem ser respeitados. O sucesso das parcerias no setor está diretamente relacionado à cooperação entre os agentes de tratamento de dados e ao comprometimento de todos com a transparência e a proteção dos direitos dos titulares.   Portanto, a gestão da privacidade e da proteção de dados no setor de incorporação imobiliária exige uma abordagem integrada e contínua. A conformidade com a LGPD não pode ser vista apenas como uma obrigação legal, mas como uma oportunidade de fortalecer a confiança dos clientes e melhorar a reputação das empresas no

Incorporadores imobiliários e proteção de dados: Como funciona a responsabilidade em casos de vazamento

Incorporadores imobiliários e proteção de dados: Como funciona a responsabilidade em casos de vazamento

No cenário atual, a proteção de dados e informações pessoais se tornou uma preocupação central para as empresas, incluindo os incorporadores imobiliários. O vazamento de informações de cadastro pode acarretar graves consequências para as partes afetadas e entender as implicações da responsabilidade civil solidária e subsidiária nesse contexto é fundamental. Este artigo explora como essas modalidades de responsabilidade se aplicam a situações de vazamento de informações de cadastro envolvendo incorporadores imobiliários. O mercado imobiliário lida com uma grande quantidade de informações pessoais e financeiras dos clientes, como dados de cadastro e informações bancárias. O vazamento dessas informações pode resultar em danos significativos, como fraudes e roubo de identidade. Quando ocorre um vazamento, a questão da responsabilidade civil torna-se crucial, especialmente no que diz respeito a quem deve ser responsabilizado e como a responsabilidade é compartilhada entre diferentes partes envolvidas.   O papel da responsabilidade solidária em casos de vazamento de dados imobiliários No contexto de vazamento de informações, a responsabilidade solidária pode se aplicar em situações em que múltiplos atores estão envolvidos, como: Parcerias e contratos de prestação de serviços: Se um incorporador imobiliário utiliza serviços de terceiros para gestão de dados (por exemplo, empresas de TI ou consultorias), todos os envolvidos na cadeia de gestão e segurança de dados podem ser responsabilizados solidariamente. Se houver um vazamento, o incorporador e seus parceiros podem ser igualmente responsáveis pela reparação dos danos; Responsabilidade compartilhada: Quando há várias entidades envolvidas na coleta, armazenamento e processamento de dados, a responsabilidade pode ser solidária, especialmente se o vazamento resultar de falhas em diferentes níveis do sistema de proteção de dados; Responsabilidade subsidiária: Implicações para incorporadores e prestadores de serviço; A responsabilidade subsidiária, por outro lado, pode ocorrer nas seguintes circunstâncias: Subcontratação de serviços de TI: Se o vazamento de dados ocorrer devido a falhas de um subcontratado (por exemplo, uma empresa especializada em segurança cibernética), o incorporador pode ser responsabilizado subsidiariamente, após esgotar as possibilidades de responsabilizar diretamente o prestador de serviços; Garantias e contratos de serviço: Caso o incorporador tenha garantias ou contratos que cobrem falhas de segurança de dados, ele pode ser responsável subsidiariamente se esses recursos não forem adequados para cobrir o total do dano.   LGPD e outras normas na proteção de dados no setor imobiliário A responsabilidade civil em casos de vazamento de dados é regida por diversas normas, incluindo: LGPD: A LGPD (lei 13.709/18) estabelece regras sobre a coleta, armazenamento e proteção de dados pessoais no Brasil. Em caso de vazamento, a LGPD prevê a responsabilidade do controlador de dados, que pode incluir incorporadores imobiliários, e define as medidas corretivas e compensatórias a serem adotadas. Código Civil Brasileiro: Define a responsabilidade civil solidária e subsidiária e pode ser aplicado em casos de violação de contratos e falhas na proteção de dados. Código de Defesa do Consumidor: Protege os direitos dos consumidores e pode ser invocado em casos em que o vazamento de dados cause danos aos consumidores. A responsabilidade civil solidária e subsidiária dos incorporadores imobiliários em casos de vazamento de informações de cadastro envolve complexidades que exigem uma compreensão detalhada das obrigações legais e contratuais. A responsabilidade solidária pode surgir quando múltiplos atores estão envolvidos na gestão de dados, enquanto a responsabilidade subsidiária pode se aplicar quando o incorporador deve responder após esgotar as opções de responsabilização direta dos prestadores de serviços. Implementar práticas eficazes de proteção de dados e ter contratos bem elaborados são passos essenciais para mitigar riscos e garantir conformidade com a legislação vigente.

A importância do registro imobiliário e sua regularização

De acordo com o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, mais de 40 milhões de imóveis no Brasil não possuem escritura pública, sendo que cerca de 60% do total dos imóveis brasileiros tem algum tipo de irregularidade a ser sanada. Tais irregularidades dificultam ou mesmo impedem transações imobiliárias, como por exemplo, a obtenção de financiamento bancário para a compra e venda de imóvel e os respectivos registro translativo imobiliário e eventuais averbações, junto ao cartório de imóveis competente. É certo, que boa parte dos imóveis existentes no país não possuem registro no cartório imobiliário, por se tratarem de posse, e os que possuem registro de propriedade no cartório, padecerem de alguma irregularidade. É preciso também esclarecer que não basta ter a escritura ou o contrato de compra e venda de imóvel assinados para tornar alguém proprietário de um bem. Tais documentos, por si só, não transferem a titularidade da propriedade, nem a constituem. A propriedade imobiliária se configura/consolida com o registro do título (escritura), como dito anteriormente, no cartório imobiliário, conforme previsto no artigo 1.245 do Código Civil Brasileiro. Portanto, repita-se, não basta celebrar um contrato de compra e venda ou lavrar uma escritura num cartório de notas, para se alcançar a propriedade. Nesse sentido, vale destacar a importância do regular registro no cartório imobiliário, pois é nele que devem estar registrados todas as informações acerca do bem, tais como, titularidade da propriedade, existência de condomínio, convenção de condomínio e regimento interno, se for o caso, área total do imóvel, área construída, eventuais gravames, ônus, hipoteca, penhora, cláusulas de inalienabilidade, dentre outras. É muito comum, a falta de atualização da matrícula do imóvel, existindo muitas vezes disparidade entre a realidade e o que está de fato registrado. Um clássico exemplo são os acréscimos construtivos com aumento da área, não contemplados na matrícula do imóvel, o que inviabiliza a aprovação do financiamento. Daí a fundamental importância de se verificar a legalidade dos processos de compra e venda, devendo o adquirente contar com a assessoria de profissionais especializados na área imobiliária (advogados/corretores), a fim de se evitar dissabores na aquisição do imóvel.