Inquérito das bets: a ligação entre o jogo online e o crime financeiro

Inquérito das bets: a ligação entre o jogo online e o crime financeiro

Com a deflagração da denominada operação Integration (inquérito policial 0022884-49.2024.8.17.2001, da 12ª Vara Criminal de Pernambuco), que investiga o crime de lavagem de dinheiro proveniente de jogos ilegais – e que resultou na prisão da influenciadora Deolane Bezerra e no indiciamento do cantor Gustavo Lima -, acirraram-se as discussões sobre a legalidade das bets e, sobretudo, das movimentações financeiras que delas decorrem. Partindo da premissa de que, tal como o jogo do bicho (art. 58 do decreto-lei 3.688/411), as apostas online também tipificariam uma contravenção penal (art. 50 do decreto-lei 3.688/412), a autoridade policial do Estado de Pernambuco considerou, dentre outras linhas de investigação, que as movimentações financeiras decorrentes das bets poderiam configurar o crime de lavagem de dinheiro, previsto no art. 1º da lei 9.613/983, que consiste em “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”. Acontece que, recentemente, em 25/11/24, o Ministério Público Pernambucano requereu o arquivamento parcial do inquérito, ao argumento de que as referidas apostas já se encontram legalizadas pela lei 14.790/23 e pelas alterações promovidas nos arts. 29 a 33 da lei 13.756/18, que regulam a modalidade de apostas de quota fixa baseadas em eventos esportivos e on-line. Logo, se as apostas não caracterizam contravenção penal, não haveria que se cogitar de posterior crime de lavagem de dinheiro, por ausência de infração penal antecedente. Seguindo essa linha de raciocínio – e olhando para o lado oposto da mesma moeda -, o Ministério Público defendeu, ainda, o prosseguimento das investigações no tocante à apuração de movimentações financeiras realizadas para ocultar ou dissimular recursos provenientes do jogo do bicho, mesclando-os com valores oriundos de outras atividades empresariais (as bets, por exemplo), para conferir-lhes aparência de licitude, o que poderia – como realmente pode – vir a caracterizar não apenas o delito de lavagem, mas também o de associação criminosa (art. 288 do CP4). Pois bem, retornando à legalidade das bets, a lei 14.790/23, em conjunto com as alterações promovidas nos arts. 29 a 33 da lei 13.756/18, instituiu e regulamentou a modalidade de apostas de quota fixa, relacionadas a eventos esportivos e on-line, autorizando os operadores do mercado a explorarem essa atividade no Brasil. Consoante o art. 2º, inciso I, da lei 14.790/23, entende-se por aposta o ato por meio do qual se coloca determinado valor em risco, na expectativa de obtenção de um prêmio, sendo que o termo quota fixa está descrito como o “fator de multiplicação do valor apostado que define o montante a ser recebido pelo apostador, em caso de premiação, para cada unidade de moeda nacional apostada” (art. 2º, inciso II, da mesma lei5). O art. 29, § 1º, da lei 13.756/18, por sua vez, conceitua aposta de quota fixa como o sistema de apostas relativas a eventos reais ou virtuais, no qual se define, no momento da efetivação da aposta, quanto o apostador poderá ganhar caso acerte seu prognóstico. Socorrendo-se dos citados dispositivos, e invocando também o art. 3º da lei 14.790/236, que prevê que “as apostas de quota fixa (…) poderão ter por objeto I – eventos reais de temática esportiva; ou II – eventos virtuais de jogos on-line”, o Ministério Público Pernambucano pontuou que o legislador, ao conceituar e regular as apostas, acabou por derrogar o art. 50 do decreto-lei 3.688/41, assim redigido: “Art. 50. Explorar ou estabelecer jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento ou não de entrada, constitui crime, com pena de prisão simples, de três meses a um ano, e multa, de dois a quinze contos de réis, estendendo-se os efeitos da condenação à perda dos móveis e objetos de decoração do local. (…) § 3º Consideram-se jogos de azar: a) o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusivamente ou principalmente da sorte; b) apostas em corridas de cavalos fora de hipódromos ou locais autorizados; c) apostas em qualquer outra competição esportiva”. Em outros termos, segundo o Ministério Público, a regulamentação das bets teria importado em abolitio criminis em relação às apostas vinculadas a competições esportivas, as quais, até então, permaneciam vedadas por tipificarem a contravenção de jogos de azar. De tal modo, pugnou o Parquet pelo arquivamento da investigação, especificamente quanto ao crime de lavagem de dinheiro decorrente de apostas esportivas, devido à ausência de justa causa para o oferecimento de denúncia, em virtude da atipicidade da conduta. Com efeito, independentemente das controvérsias morais, religiosas, psíquicas, econômicas e sociais que possam pairar sobre os jogos de apostas, a realidade é que, hoje, as bets estão permitidas e reguladas pelo legislador pátrio, sendo passíveis, inclusive, de tributação, por meio do imposto de renda (art. 31 da lei 13756/187) e da cobrança de “Taxa de Fiscalização” (art. 32 da mesma lei8). A despeito da existência de questionamentos sobre a legitimidade dessa arrecadação, tendo em vista possível ocorrência de bis in idem tributário sobre os prêmios obtidos, o fato é que o Brasil, enfim, reconheceu a realidade e, mais do que isso, a legalidade desse tipo de aposta, que, por isso, deixou de configurar a contravenção penal do art. 50 do decreto-lei 3.688/41. Portanto, parece-nos acertada a manifestação ministerial que afastou a hipótese de lavagem de dinheiro envolvendo recursos financeiros oriundos das bets, dada a atipicidade da conduta antecedente. De outro giro, a conclusão alcançada não impede a ocorrência do delito de lavagem quando valores advindos de condutas ilícitas estiverem mesclados com recursos resultantes das bets, ou quando as apostas forem utilizadas pelos operadores e empresas parceiras justamente para ocultar ou dissimular dinheiro obtido a partir de infrações penais anteriores (como o jogo do bicho), valendo, neste caso, destacar o cuidado que teve o legislador ao dispor, no art. 25 da lei 14.790/23, que “O agente operador de apostas deverá, na forma estabelecida pela regulamentação do Ministério da Fazenda, implementar procedimentos de: I – análise das apostas por meio de mecanismos de monitoramento e de seleção, com o objetivo de caracterizá-las ou não como

Decisões do STF em foco: Uma análise das ADIs 7.416/MS e 3.877/DF

Decisões do STF em foco: Uma análise das ADIs 7.416/MS e 3.877/DF

As recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7.416/MS e 3.877/DF levantam questões importantes sobre a competência legislativa e a proteção dos direitos dos consumidores no setor de telecomunicações. Como advogado especializado em telecomunicações e direito do consumidor, é essencial analisar criticamente os possíveis conflitos entre essas decisões e seus potenciais reflexos. ADI 7.416/MS: Transparência na velocidade de Internet Na ADI 7.416/MS, o STF validou a lei do Estado de Mato Grosso do Sul que obriga as prestadoras de serviços de internet móvel e de banda larga a apresentarem informações detalhadas na fatura mensal sobre a medição diária de velocidade de recebimento e envio de dados. A decisão foi fundamentada no entendimento de que a norma trata de direito do consumidor, um tema que pode ser regulamentado tanto pela União quanto pelos estados. O Tribunal considerou que a transparência sobre a entrega diária de velocidade de dados busca dar maior proteção ao consumidor, sem comprometer aspectos técnicos ou operacionais das atividades de telecomunicações. ADI 3.877/DF: Cobrança de ponto adicional de TV por assinatura Por outro lado, na ADI 3.877/DF, o STF invalidou a lei do Distrito Federal que proibia as operadoras de cobrar pela instalação e utilização de ponto adicional de TV por assinatura. A decisão foi baseada na competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações, conforme previsto na Constituição Federal. O Tribunal entendeu que a norma distrital interferia na relação contratual entre o poder público e as concessionárias de telecomunicações, invadindo a competência normativa da União. Possíveis conflitos nas decisões A análise das duas decisões revela um possível conflito na interpretação da competência legislativa sobre telecomunicações e direito do consumidor: Competência Legislativa: Na ADI 7.416/MS, o STF permitiu que um estado legislasse sobre um aspecto relacionado ao direito do consumidor, mesmo que tangencialmente envolvesse telecomunicações. Já na ADI 3.877/DF, o Tribunal foi mais restritivo, invalidando uma lei distrital que interferia diretamente na prestação de serviços de telecomunicações. Proteção ao Consumidor vs. Competência da União: A decisão na ADI 7.416/MS favorece a proteção ao consumidor ao exigir transparência das operadoras de internet, enquanto a decisão na ADI 3.877/DF prioriza a competência exclusiva da União para regular telecomunicações, limitando a atuação dos estados e do Distrito Federal. Impacto nas Operadoras: Ambas as decisões impactam as operadoras de telecomunicações, mas de maneiras diferentes. A decisão na ADI 7.416/MS impõe uma obrigação adicional às operadoras, enquanto a decisão na ADI 3.877/DF remove uma restrição imposta por uma lei distrital. Potenciais reflexos Os reflexos dessas decisões são múltiplos e complexos: Incerteza Jurídica: A aparente inconsistência nas decisões pode gerar incertezas jurídicas para as operadoras de telecomunicações, que precisam navegar entre diferentes normas estaduais e federais. Proteção ao Consumidor: A decisão na ADI 7.416/MS pode ser vista como um avanço na proteção dos direitos dos consumidores, ao exigir maior transparência das operadoras. No entanto, a decisão na ADI 3.877/DF pode ser interpretada como uma limitação à capacidade dos estados de proteger os consumidores em questões específicas de telecomunicações. Regulação Setorial: As decisões ressaltam a necessidade de uma regulação setorial clara e uniforme, que equilibre a proteção ao consumidor com a competência legislativa da União. Conclusão As decisões do STF nas ADIs 7.416/MS e 3.877/DF refletem a complexidade da divisão de competências entre União, estados e Distrito Federal. Enquanto uma decisão favorece a proteção ao consumidor, a outra reforça a competência exclusiva da União sobre telecomunicações. Esse aparente conflito pode gerar incertezas jurídicas e operacionais para as empresas de telecomunicações, que precisam navegar entre diferentes normas estaduais e federais. A harmonização desses entendimentos é essencial para garantir a proteção dos consumidores sem comprometer a eficiência e a inovação no setor de telecomunicações.

Compartilhamento de postes de energia: Limites e perigos da legislação criativa

Compartilhamento de postes de energia: Limites e perigos da legislação criativa

O compartilhamento de postes é um tema de grande relevância no setor de telecomunicações e energia elétrica, envolvendo distribuidoras de energia, operadoras de telecomunicações, agências reguladoras e os poderes Executivo e Legislativo. Recentemente, a discussão ganhou novos contornos com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Lei 22.474/23 do Estado de Goiás. A Lei 22.474/23 estabelecia diretrizes para o compartilhamento de infraestrutura entre exploradores de serviços públicos de energia elétrica, impondo um valor máximo para cada unidade de infraestrutura compartilhada e legitimando os municípios a cobrarem compensação financeira pela iluminação pública. No entanto, essa lei foi contestada por supostamente violar a competência administrativa e legislativa da União para dispor sobre serviços de energia elétrica, conforme previsto na Constituição Federal de 1988 (artigos 21, XII, “b”; 22, IV; e 175).   STF suspende lei estadual e reforça a centralização da regulação no setor elétrico O STF, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.722, concedeu medida cautelar para suspender a eficácia da Lei 22.474/23. A decisão foi fundamentada em dois pontos principais: a plausibilidade jurídica da alegação de violação à competência da União e o perigo da demora na prestação jurisdicional, que poderia impactar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão de serviços públicos de energia elétrica. A decisão do STF destaca a importância de respeitar a competência da União em regular os serviços de energia elétrica, evitando intervenções indevidas de legislações estaduais que possam afetar as relações contratuais entre o poder concedente e as empresas delegatárias. Além disso, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) já possui regulamentos específicos que dispõem sobre os preços de referência para o compartilhamento de postes, reforçando a necessidade de uma regulação uniforme e centralizada. Essa decisão do STF reflete a complexidade e a importância do tema, que envolve não apenas questões jurídicas e regulatórias, mas também impactos econômicos significativos para as empresas e para a prestação de serviços públicos essenciais. A suspensão da Lei 22.474/23 pelo STF reafirma a necessidade de uma abordagem coordenada e harmonizada na regulação do compartilhamento de infraestrutura, garantindo a segurança jurídica e o equilíbrio econômico-financeiro para todos os envolvidos.   A urgência de uma solução regulatória para os setores de energia e telecomunicações Apesar dos esforços para resolver a questão, como os projetos de resolução conjunta entre as agências reguladoras e o Decreto Presidencial de 12.068/24, ainda não se encontrou um caminho eficaz para avançar com uma solução definitiva. A urgência em resolver essa questão é evidente, pois a falta de uma regulamentação clara e eficiente tem gerado insegurança jurídica e prejudicado o desenvolvimento dos serviços de telecomunicações e energia elétrica. Portanto, é muito importante que as partes envolvidas acelerem o processo de busca por uma solução que atenda aos interesses de todos, garantindo a continuidade e a qualidade dos serviços prestados à população. A harmonização das normas e a cooperação entre as diferentes esferas de governo e agências reguladoras são essenciais para superar os desafios e promover um ambiente regulatório estável e favorável ao crescimento dos setores envolvidos.

Domicílio Judicial Eletrônico: CNJ estabelece prazo para implantação obrigatória da plataforma

Domicílio Judicial Eletrônico: CNJ estabelece prazo para implantação obrigatória da plataforma

No dia 13 de agosto de 2024, o CNJ publicou a Resolução de nº 569/2024, no intuito de disciplinar a utilização do chamado “Domicílio Judicial Eletrônico” e do Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN) – decorrência do disposto no CPC, art. 254, alterado pela Lei nº 14.195/2021. O DJEN foi definido como a plataforma oficial para a comunicação de atos judiciais, substituídos outros meios de publicação oficial, exceto quando exigida intimação pessoal. Leia também: Alterações na regulamentação do Domicílio Judicial Eletrônico (DJE) A obrigatoriedade da utilização da plataforma dar-se-á a partir de 11/11/2024 e estima-se que cerca de 20 milhões de CNPJs serão inseridos nos bancos de dados do Poder Judiciário para que se cumpra tal programa. O decurso do prazo começará, a partir de então: a) para pessoas jurídicas de direito público em 10 dias corridos, caso não haja visualização do ato comunicativo; b) para as demais, em 5 dias. As sociedades empresariais interessadas em promover o seu cadastro deverão acessar https://www.cnj.jus.br/tecnologia-da-informacao-e-comunicacao/justica-4-0/domicilio-judicial-eletronico/

Inventário extrajudicial e incapacidade: O impacto da Resolução 571 na prática jurídica

Inventário extrajudicial e incapacidade: O impacto da Resolução 571 na prática jurídica

A resolução 35 do CNJ foi recentemente alterada pela resolução 571 de 26/08/2024, que trouxe várias inovações aos procedimentos extrajudiciais, uma delas é a possibilidade de realização de inventário extrajudicial com incapaz. Antes da alteração trazida pela nova resolução, as condições para realização de inventário por escritura pública, ou seja, inventário extrajudicial, eram basicamente duas, quais sejam: a inexistência de herdeiro incapaz e o consenso entre todos os herdeiros. Todavia, com o advento da nova resolução, especificamente o artigo 12-A, torna-se possível e viável, mesmo havendo herdeiros incapazes, a lavratura de escritura pública de inventário em cartório, observadas e cumpridas determinados requisitos contidos no mencionado artigo. O primeiro requisito, expresso no artigo 12-A, impõe que o pagamento do quinhão hereditário ou meação em favor do interessado incapaz ocorra em parte ideal em cada um dos bens inventariados. O segundo requisito previsto na norma exige a manifestação favorável do Ministério Público. Numa leitura rápida do dispositivo, as condições trazidas pelo artigo 12-A não oferecem aparentemente obstáculos, contudo, algumas dificuldades podem ocorrer diante de casos concretos específicos. Com relação ao requisito do pagamento obrigatório do quinhão hereditário ou meação em parte ideal e em cada um dos bens, o primeiro questionamento que surge é como se daria esse pagamento? E o que isso significa na prática e quais seriam os eventuais desdobramentos? Quinhão ideal dos bens, nada mais é do que o condomínio obrigatório a que faz jus o herdeiro/interessado incapaz em todos os bens do inventário, juntamente com os demais herdeiros. Isso significa que no inventário extrajudicial, o menor ou incapaz deterá obrigatoriamente uma parte ideal em cada um dos bens relacionados no inventário, não cabendo, nesse procedimento, a distribuição dos bens de forma individual e isolada entre os herdeiros. Isso representa na prática um verdadeiro travamento de todos os bens, visto que o incapaz teria direito a uma parcela sobre todos os bens inventariados. No que se refere à manifestação favorável do MP, como requisito a ser observado para a realização de inventário extrajudicial com incapaz, a norma silencia em que momento deverá ocorrer (antes ou depois), portanto, importa verificar o aspecto temporal dessa manifestação, sendo recomendável ao advogado submeter previamente ao MP a minuta de escritura com todas as informações e documentos, a fim de evitar o pagamento de custos e emolumentos desnecessários, caso o MP não seja favorável. Caso o Ministério Público considere injusta a divisão deverá remeter o inventário ao juiz. Da mesma forma, se o tabelião tiver dúvidas quanto à validade da escritura deverá encaminhar ao juiz competente. Ainda com relação ao condomínio obrigatório, havendo necessidade ou interesse dos herdeiros em alienar determinado bem do inventário, esta deverá contar com a autorização judicial (§1º – Art. 12-A), uma vez que é vedado ao incapaz atos disposição de direitos e bens (ex. renúncia, cessão de direitos etc.), o que, de certa forma, engessa o procedimento extrajudicial. Resta evidente o objetivo contido na norma ao prever os requisitos para a realização do inventário extrajudicial, que visam à proteção dos direitos dos incapazes, mas que, por outro lado, acabam por dificultar, por exemplo, a venda de bens. Nesse contexto, é importante considerar que, dependendo do caso concreto e dos interesses específicos das partes envolvidas, um aconselhamento jurídico prévio ao cliente se torna imprescindível. Essa orientação não apenas esclarece os aspectos legais envolvidos, mas também permite uma análise mais aprofundada das particularidades do inventário, especialmente quando há um incapaz no processo. Com essa avaliação cuidadosa, será possível determinar se a opção pelo inventário extrajudicial é realmente o melhor caminho a ser seguido, garantindo assim a proteção dos direitos de todos os envolvidos e a efetividade do processo.

A posição atual da ANATEL sobre as plataformas digitais

A posição atual da ANATEL sobre as plataformas digitais

Nos últimos anos, a ascensão das plataformas digitais de conteúdo, como redes sociais, serviços de streaming e aplicativos de comunicação, levantou debates sobre o papel regulador da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) no Brasil. O foco tem sido, em especial, sobre a responsabilidade dessas plataformas em relação à disseminação de conteúdo, à moderação de informações e à transparência nas operações. Embora a ANATEL tenha tradicionalmente focado sua regulação nos serviços de telecomunicações, como telefonia e internet, a crescente convergência entre telecomunicações e o setor digital coloca a agência em uma posição de repensar suas funções e fronteiras regulatórias.   O contexto das plataformas de conteúdo e o desafio da regulação Plataformas como YouTube, Facebook, Instagram e WhatsApp tornaram-se elementos centrais na forma como os cidadãos consomem e compartilham informações. Estas empresas, muitas delas internacionais, operam como intermediárias na distribuição de conteúdo produzido por terceiros, gerando uma nova dinâmica no fluxo de comunicação que ultrapassa as fronteiras tradicionais do setor de telecomunicações. Enquanto tradicionalmente a ANATEL regula serviços de infraestrutura (operadoras de telefonia, provedores de internet, serviços de radiodifusão), plataformas de conteúdo vêm operando sem uma regulação específica no Brasil. No entanto, a relevância crescente dessas plataformas na disseminação de notícias, entretenimento e até mesmo desinformação tem provocado discussões sobre a necessidade de expandir o escopo regulatório da ANATEL, ou de outras autoridades competentes, para cobrir também esses novos agentes.   A interpretação da Lei Geral de Telecomunicações (LGT) A Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que estabelece as diretrizes para a regulação do setor, não contempla diretamente as plataformas digitais de conteúdo, uma vez que foi criada antes da ascensão massiva dessas tecnologias. A LGT trata majoritariamente de infraestrutura e prestação de serviços de telecomunicações, e não da mediação ou distribuição de conteúdo digital. No entanto, algumas interpretações mais recentes sugerem que, à medida que essas plataformas utilizam a infraestrutura de telecomunicações para operar (como as redes de dados), sua regulamentação poderia, em tese, se alinhar com as competências da ANATEL. Há um debate crescente sobre se a agência deve, ou não, assumir um papel mais ativo na regulamentação de plataformas que distribuem conteúdo, especialmente em áreas como moderação de desinformação e proteção de dados dos usuários.   Responsabilidades e propostas em discussão A posição da ANATEL em relação às responsabilidades das plataformas de conteúdo, até o momento, tem sido de cautela. Isso se deve ao fato de que há sobreposição de competências com outros órgãos reguladores, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que cuida de práticas concorrenciais, e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), responsável pela proteção de dados pessoais. No entanto, há áreas específicas onde a ANATEL vem discutindo uma atuação mais clara, especialmente em relação à infraestrutura utilizada por essas plataformas. Algumas propostas envolvem: Regulação de qualidade de serviço: A ANATEL tem analisado como garantir que as plataformas mantenham padrões de qualidade na entrega de conteúdo via internet, especialmente em questões de largura de banda e tráfego de dados. Transparência no uso de infraestrutura: Há um debate sobre a necessidade de que as plataformas divulguem como utilizam as redes de telecomunicações, principalmente para evitar congestionamentos e garantir uma distribuição equitativa de acesso. Parcerias para moderação de conteúdo: Embora não diretamente reguladora do conteúdo, a ANATEL poderia apoiar esforços colaborativos com outras entidades, como a ANPD, para garantir que plataformas respeitem leis de proteção de dados e ajam com transparência na moderação de informações.   A convergência entre Telecomunicações e Mídia Digital A principal questão que a ANATEL enfrenta hoje é a convergência entre telecomunicações tradicionais e novas formas de mídia digital. A digitalização de praticamente todos os aspectos da comunicação trouxe novos desafios para a regulação. As operadoras de telecomunicações, historicamente reguladas pela ANATEL, competem agora com plataformas digitais que oferecem serviços como chamadas de voz e vídeo via internet, mensagens instantâneas e streaming de vídeo. Essa situação criou tensões entre os provedores de infraestrutura e as plataformas de conteúdo, com os primeiros argumentando que as plataformas digitais utilizam suas redes sem estarem sujeitas à mesma carga regulatória. Por exemplo, plataformas de streaming, como Netflix e YouTube, geram enorme demanda de tráfego nas redes de telecomunicações, levando operadoras a buscar mais clareza sobre as responsabilidades dessas empresas. Nesse cenário, a ANATEL vem explorando caminhos para garantir um campo regulatório mais equilibrado, onde tanto as operadoras quanto as plataformas digitais contribuam para o desenvolvimento sustentável das redes de comunicação.   O futuro da regulação das plataformas digitais A ANATEL, ainda que relutante em expandir diretamente sua atuação sobre plataformas de conteúdo, reconhece a importância de discutir o tema à luz dos novos desafios digitais. A responsabilidade dessas plataformas, particularmente no que diz respeito à transparência, uso da infraestrutura e proteção dos direitos dos usuários, precisa ser abordada de maneira coordenada, envolvendo não apenas a ANATEL, mas também outros órgãos reguladores e legisladores. O caminho para a regulação dessas plataformas no Brasil permanece incerto, mas a ANATEL está claramente atenta à necessidade de adaptar suas diretrizes para um cenário digital em rápida transformação. O desafio, no entanto, será equilibrar a inovação com a proteção dos usuários e a sustentabilidade das redes de telecomunicações no país

Manutenção da telefonia fixa pode gerar alto custo ao contribuinte

Manutenção da telefonia fixa pode gerar alto custo ao contribuinte

Neste artigo, com a participação especial de Rafael Pistono (sócio do PDK Advogados), vamos falar sobre como a manutenção da telefonia fixa pode gerar altos custos ao contribuinte. Confira mais nesta leitura! O capítulo final do processo de privatização do setor de telecomunicações no Brasil — iniciado em 1997 — pode não terminar em 31 de dezembro de 2025, quando se encerram os contratos de concessão dos serviços de telefonia fixa. Numa reunião extraordinária prevista para quinta-feira (10), o conselho diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) vai deliberar sobre a rescisão do contrato da Oi e instaurar o novo processo que permitirá a migração para o regime de autorização. A partir desta semana, portanto, a Oi fica livre de dispendiosas obrigações regulatórias incluídas no regime de concessão da telefonia fixa — em artigo publicado em 30 de setembro, o diretor-presidente da Oi, Mateus Bandeira, estimou em R$ 3 bilhões por ano o custo de manter a infraestrutura necessária à prestação do serviço, incluindo os obsoletos orelhões. Em contrapartida, a Oi concordou em investir, no mínimo, R$ 6 bilhões em infraestrutura e conectividade. O montante será, na sua maior parte, desembolsado pela V.tal, empresa de infraestrutura digital neutra na qual a Oi detém participação de 16,15% do capital social. A Telefônica está perto de firmar um acordo nos mesmos moldes, também costurado de forma consensual pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Falta agora apenas a deliberação do plenário do TCU sobre o tema para que a Anatel possa prosseguir. No caso da multinacional espanhola, que detém a concessão do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC) no Estado de São Paulo, o investimento previsto como contrapartida à mudança de regime é de R$ 4,5 bilhões. Mesmo com as soluções encaminhadas para as concessões de Oi e Telefônica, o modelo de concessão do STFC pode ter uma sobrevida onerosa ao contribuinte brasileiro. Em evento na semana passada, o presidente da Anatel, Carlos Baigorri, informou que o processo de migração da Embratel (parte do grupo Claro) está em negociação, mas os das concessionárias Algar e Sercomtel nem começaram. A solução depende de consenso não só entre as operadoras e a Anatel, mas também envolve TCU, Advocacia-Geral da União (AGU) e o Ministério das Comunicações.   Nova concessão do serviço de telefonia fixa Como não há garantia de que vai se chegar a um acordo com todas as cinco operadoras, a Anatel prepara um edital para licitar, em 2025, uma nova concessão do serviço de telefonia fixa. “Hoje, uma outorga, uma licença para prestar [o serviço de] telefonia fixa no Brasil todo, sem nenhuma obrigação, custa R$ 400. Você imagina o preço de uma outorga de telefonia fixa, em regime público, com um monte de obrigações. O preço dela vai ser negativo. Para alguém prestar esse serviço, ele vai cobrar do Estado”. explicou Baigorri. Caso não haja interessados, a solução pode sair ainda mais dispendiosa: por lei, o próprio Estado deverá prestar o serviço.   “Bens reversíveis” Na prática, a solução consensual obtida no caso da Oi pôs fim a uma controvérsia sobre os chamados “bens reversíveis” que se arrastava, pelo menos, desde a década passada. Bens reversíveis são, por lei, os ativos essenciais e efetivamente empregados na prestação do serviço concedido e que deveriam retornar à União ao fim do período de concessão, no próximo ano. “Os bens reversíveis não vão voltar para a União. Essa é a privatização de fato”, resume o especialista em regulação Rafael Pistono, sócio do escritório PDK Advogados. Pistono questiona o fato de nunca ter havido consenso entre concessionárias e regulador a respeito da valoração desses bens e da própria definição precisa do que seriam os bens reversíveis. Com um novo edital para o STFC ainda em elaboração, fica em aberto a questão de se um futuro concessionário — se houver interessados — prestaria o serviço a partir de bens reversíveis ou não. O que está decidido, até o momento, é que venceria a licitação o proponente que oferecer o menor preço para prestar o serviço.

CNJ aprova novas regras para acordos trabalhistas extrajudiciais: Entenda a Resolução nº 586

CNJ aprova novas regras para acordos trabalhistas extrajudiciais: Entenda a Resolução nº 586

Neste artigo, vamos entender os alguns pontos da Resolução nº 586 e suas implicações para trabalhadores e empregadores.   No dia 30 de setembro de 2024, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a Resolução nº 586, que dispõe sobre a validade e novas regras para os acordos trabalhistas extrajudiciais.   Com base na nova Resolução, os acordos extrajudiciais homologados pela Justiça do Trabalho poderão dar ampla e geral quitação sobre todas as verbas contratuais, impossibilitando o ajuizamento de novas ações, desde que: i. As partes estejam representadas por advogado próprio ou Sindicato; ii. Haja previsão expressa de quitação ampla, geral ou irrevogável na minuta de acordo; iii. As partes se manifestem de boa-fé, afastando qualquer possibilidade de vício de vontade e coação. A Resolução destaca que (i) direitos e/ou verbas desconhecidas no momento da negociação, (ii) matérias que envolvam acidente de trabalho, sequelas e doenças ocupacionais desconhecidas ou (iii) não citadas no acordo, não serão alcançadas pela quitação total.   Os acordos poderão ser homologados em âmbito extraprocessual, ou seja, sem o ajuizamento de ação. Para isso, o acordo deve ser realizado junto aos Centros Judiciários de Métodos Consensuais de Solução de Disputas da Justiça do Trabalho (Cejusc-JT), mediante provocação das partes ou seus representantes. Neste momento, por uma questão de análise de impacto e eficácia da Resolução, as normas aprovadas servirão apenas para acordos em valor superior a 40 (quarenta) salários-mínimos.   Em síntese, a Resolução nº 586 do CNJ estabelece um novo cenário para os acordos trabalhistas extrajudiciais, proporcionando maior agilidade e segurança jurídica nas relações de trabalho. Com a possibilidade de quitação ampla e geral, é fundamental que as partes se atentem às condições exigidas para a homologação e às limitações sobre direitos não mencionados no acordo.   Para se manter atualizado sobre as novidades e temas relacionados ao direito trabalhista, convidamos você a acompanhar o blog do PDK Advogados.  

Registro de Software no INPI: Vale a pena proteger sua criação?

Registro de Software no INPI: Vale a pena proteger sua criação?

Nesse artigo nós vamos abordar o Registro de Software no INPI e entender se vale a pena proteger a sua criação! Um programa de computador, também conhecido como software, consiste em um conjunto estruturado de instruções escritas em uma linguagem de programação (código-fonte) que permite a execução de uma ou mais tarefas. Essas instruções são convertidas em uma linguagem compreensível por dispositivos eletrônicos (código-executável ou código-objeto). No Brasil, os programas de computador são protegidos pela legislação de direitos autorais, sendo regulados pela lei 9.609, conhecida como a lei do software. Diferentemente de outros ativos de propriedade industrial, como marcas e patentes, a proteção dos direitos autorais não requer registro, mas o registro do software proporciona uma maior segurança jurídica ao titular, como se verá adiante. Além disso, é possível patentear um software se ele for considerado uma invenção ou modelo de utilidade, atendendo aos critérios de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. Entretanto, o próprio código-fonte não pode ser patenteado; a patente pode ser obtida apenas quando o software é combinado com hardware que, juntos, atendam aos requisitos legais.   Registro no INPI Embora a proteção por direito autoral dispense o registro, o INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial oferece um sistema eletrônico, chamado e-Software, para registrar programas de computador. O registro proporciona proteção internacional ao titular e é realizado de forma totalmente online, com uma decisão automatizada. O registro assegura uma maior segurança jurídica em eventuais disputas judiciais, comprovando a titularidade do programa. A seguir, apresentamos as vantagens e desvantagens do registro de software, além do procedimento para realizá-lo junto ao INPI.   Vantagens do registro Procedimento ágil: O registro é rápido, com baixa burocracia e custo acessível. Comprovação de autoria: Facilita a prova de titularidade em casos de litígios. Proteção contra concorrência desleal: Garante defesa contra cópias ilegais e pirataria. Comercialização internacional: Auxilia na remessa de royalties, caso o software seja comercializado fora do país. Segurança jurídica: Proporciona uma base legal sólida para o negócio. Facilita transações: Beneficia processos de due diligence e vendas, permitindo a transferência segura de direitos patrimoniais. Licenciamento mais seguro: Possibilita a criação de contratos de licenciamento com maior segurança. Critério para financiamento: Pode ser um dos requisitos para editais de financiamento do governo federal. Participação em licitações: Pode ser exigido para concorrências públicas.   Desvantagens do registro Ao desenvolver novas versões do software, é necessário solicitar um novo registro, uma vez que a proteção se aplica ao código e não à função do programa. Portanto, a cada atualização que gera um novo código, um novo registro deve ser feito para garantir a proteção. Dependendo da frequência de atualizações, isso pode tornar-se oneroso e até inviável. Embora o custo de registro de software seja baixo em comparação com outros serviços do INPI, a necessidade de registrar continuamente as atualizações pode não compensar em todas as situações. Por isso, o registro pode ser mais vantajoso para softwares considerados estratégicos. Legislação aplicável Diversas normas regulam o registro de software no Brasil, incluindo: Lei 9.609/98 – Lei de Software; Decreto 2.556/98 – estabelece o INPI como órgão responsável pelo registro de programas de computador; Instrução normativa 074/17 – define os procedimentos para o registro; Resolução 200/17 – Tabela de retribuição do INPI. Quem pode solicitar o registro O registro de software pode ser solicitado por pessoas físicas e jurídicas. Validade do registro O registro de um programa de computador é válido por 50 anos, contados a partir da sua criação ou do primeiro dia do ano seguinte à sua publicação. Abrangência do registro A proteção é internacional, abrangendo os 175 países que assinaram a Convenção de Berna (1886). Procedimento de Registro de Software no INPI Documentação: Antes de solicitar o registro, o requerente deve criptografar o texto ou arquivo do código-fonte usando um algoritmo que gere um resumo digital hash. Esse resumo deve ser inserido no formulário eletrônico de depósito, junto com a DV – Declaração de Veracidade, que é gerada pelo sistema da GRU – Guia de Recolhimento da União. Emissão da guia: Para dar início ao registro, é necessário emitir a GRU com o código 730. O pagamento deve ser realizado antes de formalizar o pedido e o número da guia deve ser guardado. Na emissão da GRU, o requerente deve baixar e assinar digitalmente a DV. Pedido: Após o pagamento da GRU, o requerente acessa o e-Software e preenche o formulário online, incluindo o resumo hash e a DV assinada. Acompanhamento: Após a confirmação do pagamento, o registro é geralmente publicado em até 10 dias. O certificado pode ser baixado no portal do INPI cerca de 7 dias úteis após a decisão. O andamento do processo pode ser acompanhado por meio da RPI – Revista da Propriedade Industrial ou pelo sistema de busca do INPI.  

A importância da Anatel na discussão sobre as BETs no Brasil

A importância da Anatel na discussão sobre as BETs no Brasil

Recentemente, a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações tem estado envolvida em várias ações relacionadas a sites de apostas esportivas.1. Então, nesse artigo nós vamos abordar a importância da Anatel na discussão sobre as BETs no Brasil.   A Anatel e a certificação das casas de apostas no Rio de Janeiro Recentemente, uma decisão judicial determinou que a Anatel deveria certificar a legitimidade das casas de apostas para operar dentro dos limites do estado do Rio de Janeiro. Caso essas casas de apostas estejam em desacordo com a legislação estadual, a Anatel deveria suspender suas atividades no estado. Em 07/8/24, a Loterj – Loteria do Estado do Rio de Janeiro ajuizou uma ação com pedido de tutela antecipada antecedente contra a Anatel, solicitando que esta notificasse os provedores de conexão para bloquearem ou suspenderem o funcionamento de centenas de sites de apostas indicados pela Loterj na ação. Os sites de apostas alvo do bloqueio eram aqueles que não haviam solicitado a licença estadual, conforme estabelecido pelo decreto do estado do Rio de Janeiro 48.806/23.   Decisões judiciais e embargos Inicialmente, o pedido liminar da Loterj foi indeferido em primeira instância. No entanto, essa decisão foi parcialmente reformada em sede de agravo de instrumento, autorizando a Anatel a verificar a legitimidade operacional das empresas listadas na inicial perante a Loterj e, em caso de irregularidade, tomar as providências cabíveis, dentro dos limites do estado do Rio de Janeiro, para suspender as atividades de loteria de apostas de quota fixa que estivessem em desacordo com a legislação aplicável. Diversas casas de apostas apresentaram embargos de declaração e interpuseram recurso de agravo interno contra essa decisão, assim como a AGU – Advocacia Geral da União. Em 12/8/24, o relator revogou a medida pretendida pela Loterj, determinando que as casas de apostas regularizassem suas operações até 31/12/24.   Posicionamento da ANATEL sobre competência legal Em 20/8/24, logo após a decisão, a Loterj apresentou manifestação desistindo da ação principal contra a Anatel. Em 22/8/24, o juízo da 13ª vara Federal Cível da SJDF apreciou o pedido da Loterj e extinguiu a ação por falta de legitimidade recursal da Loterj. A petição inicial foi assinada pelo presidente da Loterj, que, apesar de ser advogado inscrito na OAB, está impedido de exercer a advocacia enquanto presidente da autarquia. Assim, nos termos da sentença, nem mesmo o pedido de desistência poderia ter sido apreciado. Diante dessa decisão, ainda cabe recurso por parte da Loterj. Além disso, o agravo de instrumento interposto anteriormente está pendente de julgamento. No entanto, considerando que a ação principal foi extinta, o agravo de instrumento deverá ser julgado prejudicado. Nesse cenário, a questão da competência para legislar sobre a regulamentação/autorização das casas de apostas, por ora, não será apreciada pelo TRF. Com dito, a ação teve origem em um pedido da Loterj, que alegou que diversas plataformas de apostas estavam operando de forma irregular no estado.   E, como se posicionou a ANATEL? No âmbito dos argumentos trazidos pela Anatel, vale a reflexão sobre a ilegitimidade passiva da agência, já informada na ação da 13ª vara da seção Judiciária do Distrito Federal, que foi reformada pelo TRF1. A Anatel destacou que sua função é regular a prestação dos serviços de telecomunicações e que não há qualquer dispositivo na LGT que autorize a agência a determinar que uma prestadora de serviço de telecomunicações efetue o bloqueio administrativo de conteúdo exposto na internet. “É preciso ter em mente que há, de um lado, os aspectos técnicos e de infraestrutura, sobre os quais incide a jurisdição da Anatel. De outro lado, os conteúdos propriamente ditos, que trafegam pelas redes de telecomunicações, em relação aos quais a Anatel não possui ingerência. Como bem colocado no Ofício 103/24/PR-Anatel (ID 2125313418), a Anatel não possui competência legal para determinar às prestadoras de serviços de telecomunicações que procedam ao bloqueio de sites que operam ilegalmente apostas no território brasileiro, mais especificamente no estado do Rio de Janeiro”, registrou a Agência.   Marco civil da internet e jurisdição A Anatel também destacou que a imposição de bloqueio de conteúdos publicados na internet e a atribuição de responsabilidade a provedores de aplicação ou de conexão por conteúdos publicados por terceiros é um tema sensível e controverso, cuja regulamentação está nas disposições do marco civil da Internet (lei 12.965/14) e em precedentes do STJ. Em regra, o bloqueio de conteúdos ilícitos ou ofensivos é efetuado após a emissão de uma ordem judicial, o que também constitui pressuposto para a responsabilização do provedor de aplicação responsável. A Anatel lista os casos previstos, como aqueles que violem os termos de uso da plataforma em algumas redes sociais, com conteúdos que propaguem desinformação ou expressem ofensas de teor discriminatório, divulgação de cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado e conteúdos que violem direitos autorais. “Como se vê, o modelo legal em vigor no Brasil, tal como disposto no marco civil da Internet e interpretado pelo STJ, não comporta a hipótese de indisponibilização de conteúdo na internet mediante ordem proferida pela Anatel às prestadoras de serviços de telecomunicações, como pretende a autora nos presentes autos”, informa a petição. Segundo a Anatel, a decisão do desembargador do TRF1 não se aplica às regras excepcionais previstas no marco civil da Internet, que autorizam o bloqueio de sites independentemente de ordem judicial. “Nesse contexto, resta demonstrada a absoluta incompetência legal da Anatel para determinar o bloqueio de sites que operam ilegalmente apostas no território brasileiro, mais especificamente no Estado do Rio de Janeiro, isso porque a hipótese de retirada de conteúdo na internet por ordem proferida pela Anatel, requerida pela autora, destoa do modelo legal vigente”, comenta a agência. A petição também informa que a “Anatel não é operadora de serviço de telecomunicações e, portanto, não possibilita que os provedores de conteúdo de internet veiculem seus materiais, de maneira que, do mesmo modo, não possui condições técnicas de impedir suas atividades”.   Implicações jurídicas e regulatórias A discussão judicial, a par de questões técnicas que forma muito bem levantadas pela Anatel